A ataxia espinocerebelosa do tipo 3 (SCA3) é uma doença neurodegenerativa hereditária dominante, integrando o grupo de doenças de poliglutamina (polyQ) como a forma mais prevalente de ataxia espinocerebelar. A SCA3 é causada pela sobreexpansão de uma repetição trinucleotídica citosina-adenina-guanosina (CAG) no gene ATXN3, que codifica a deubiquitinase Ataxina-3. Como resultado, a formação de um segmento polyQ expandido dentro de Ataxin-3 confere uma função tóxica a esta isoforma mutante, manifestada pela geração de microagregados proteícos e espécies tóxicas, pertubando mecanismos celulares vitais que desencadeiam a morte celular neuronal. Não existe tratamento disponível para a SCA3.
Os principais esforços para tratar a SCA3 têm-se concentrado na prevenção da produção de Ataxina-3. Entre estes, destaca-se o uso da interferência de RNA (RNAi) para silenciar a expressão do gene ATXN3 ao nível pós-transcricional. A ligação de Ataxina-3 a numerosos mecanismos celulares sugere que silenciar a expressão do gene ATXN3 poderia ser prejudicial para os pacientes a longo prazo. Este facto reforça a necessidade de métodos inovadores que possam direcionar o transcriptoma de ATXN3 e remover precisamente os transcritos que codificam o segmento polyQ causador de SCA3 de Ataxin-3, mantendo a sua atividade fisiológica endógena.
Uma abordagem promissora que surgiu nos últimos anos é a descoberta da ribonuclease Cas13 baseado em CRISPR para direcionamento de RNA. A Cas13 é um membro da família de enzimas associadas ao CRISPR que pode atingir sequências de RNA específicas e induzir a sua clivagem e degradação. A descoberta do Cas13 abriu novas oportunidades para a manipulação direcionada de RNA, incluindo a capacidade de silenciar precisamente ou influenciar o resultado da splicing de genes predeterminados sem exigir o envolvimento de vias internas para processar os transcritos-alvo. O uso da enzima Cas13 para direcionamento de RNA tem o potencial de abordar algumas das desvantagens associadas ao silenciamento convencional de genes mediado por RNAi, principalmente, os efeitos de desregulação transcricional globais ("off-targets") ou toxicidade associada à saturação de vias endógenas determinantes para o processamento de sequências RNAi. Este estudo propõe usar o sistema CRISPR/Cas13 para tratar a SCA3, removendo a função tóxica ganha de Ataxin-3 mas preservando a sua atividade fisiológica endógena. Duas abordagens diferentes serão exploradas para aplicar o sistema CRISPR/Cas13 direcionado o transcrito ATXN3. A primeira abordagem é a redução alelo-específica do transcrito mutante de gene ATXN3 através de uma ribonuclease CRISPR/Cas13. A segunda abordagem é a modulação não alelo-específica do splicing de transcritos pré-mRNA do gene ATXN3 por uma enzima CRISPR/Cas13 inativa. Ambas as estratégias terão potential para corrigir efetivamente o defeito genético associado à SCA3 e melhorar a qualidade de vida dos pacientes. Avaliaremos a eficácia e segurança das sequências de CRISPR/Cas13 direcionadas ao gene ATXN3 num modelo "in vitro" humano de neuropatologia SCA3 baseado em neurónios derivados de pacientes. Um método rápido e estabelecido será usado para gerar neurónios maduros homogéneos num curto período de tempo, contornando estados progenitores e induzindo diretamente a indução neuronal. Os neurónios SCA3 serão tratados com vírus adeno-associados que fornecerão as sequências de CRISPR/Cas13 direcionadas ao gene ATXN3 para avaliar os efeitos no transcrito e a redução do fenótipo da doença.
A pesquisa conduzida com o apoio deste projeto poderá fornecer uma nova via para o desenvolvimento de terapias inovadoras para a SCA3 e outras doenças de poliglutaminas. Esperamos que o resultado deste estudo reforce o potencial de sistemas CRISPR/Cas13 como um tratamento de próxima geração e viável para SCA3 e potencialmente outras doenças neurodegenerativas.
P25124
Coimbra
2024-03-01
2025-02-28
50'000 EUR€
Trampoline Grant, French Muscular Dystrophy Association (AFM-Téléthon)
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